segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Um exemplo de como dar dinheiro por si não chega

Uma notícia no Público levanta várias questões do foro ético e legal no comportamento de do presidente de uma ONG bem conceituada junto dos portugueses, a Aldeias de Crianças SOS Portugal:

Gestão polémica na Aldeias de Crianças SOS Portugal 

As ONGs em Portugal são muito frágeis a 'ataques' de pessoas que assumem a direcção de uma ONG, por vezes com anos de bom trabalho realizado, e desbaratam o património da ONG e o seu bom nome, não para cumprir a sua missão mas para benefício próprio. Já o vi acontecer em várias organizações portuguesas e qualquer pessoa que tenha um envolvimento com organizações filantrópicas sabe que este é um risco real. É, também, para proteger as ONGs deste tipo de ataques predatórios, munindo-as de boas práticas e solidez institucional, que é necessário implementar auditorias externas às ONGs ou criar um sistema independente de avaliação dos comportamentos destas organizações.

terça-feira, 4 de setembro de 2012

Como se avalia uma organização filantrópica? O exemplo de uma organização avaliada nos EUA.

Os métodos de avaliação de organizações filantrópicas podem variar ligeiramente. Mas em comum têm um objectivo: traduzir uma avaliação complexa num sistema de classificação de fácil leitura para um dador. O indicador da classificação pode ser estrelas (de 0 a 5), ou classificação de 0 a 100%, por exemplo.

Olhemos para o caso de uma organização filantrópica americana: Oregon Food Bank.

Vejamos a sua classificação global, para uma leitura rápida por qualquer pessoa:


E vejamos um gráfico que ajuda a perceber ainda melhor estes resultados:


Estamos portanto na presença de uma organização filantrópica que ficou classificada com 4 estrelas (máximo) na classificação global, tendo 4 estrelas tanto nos resultados sobre as Finanças da organização como nos resultados de Responsabilização & Transparência.

Não deixa de ser curioso que o termo accountability não tenha, que conheça, tradução directa em português! Aqui uso o termo responsabilização, mas é um termo insuficiente. Accountability é o cerne do que se defende neste blogue. É a disponibilidade para prestar contas a terceiros, a responsabilização perante terceiros pelos actos cometidos. Num país onde "a culpa morre solteira" nem sequer temos uma palavra para descrever este termo da ética comportamental, a submissão voluntária dos actos de alguém ao controlo externo. Coisas tão simples como assinar uma ordem, a que tanta gente ainda foge hoje em dia nos nossos serviços. A recusa em pôr por escrito uma ordem verbal, por exemplo, é o exemplo de muito baixa accountability, a capacidade de identificar a origem de um acto e responsabilizar, para o bem e para o mal, o seu actor.

Transparência é a obrigação ou disponibilidade de uma organização em publicar e tornar disponível para consulta dados essenciais sobre a organização.


Mas o que é que significam os resultados em Finanças e Responsabilização & Transparência. O que foi avaliado? Vejamos neste caso.

Nas Finanças temos a avaliação de uma série de critérios: a percentagem do orçamento gasto nos programas filantrópicos; a percentagem gasta com despesas administrativas; a percentagem gastas na angariação de donativos; a eficiência angariativa; o crescimento nos rendimentos primários; o crescimento nas despesas com os programas filantrópicos; e o rácio de capital de trabalho (determina durante quanto tempo a organização conseguiria manter os seus actuais níveis de despesa usando os bens disponíveis).


Estes dados são bastante simples de se obter de qualquer organização. Porque não são disponibilizados?

Temos ainda os resultados dos critérios de Responsabilização & Transparência. Os elementos da direcção votam de forma independente ou existe um presidente que tudo decide? Existe um relatório de contas auditado por organização independente? As reuniões de direcção são relatadas em acta? Existe uma política de conflitos de interesse? Existe uma política de protecção de denunciantes de más práticas internas? O Director Executivo é claramente identificado, assim como o seu salário? Os elementos da direcção são remunerados ou compensados de alguma forma? Tornam pública esta informação, nomeadamente quem faz parte da direcção e o relatório de contas auditado?




Estamos portanto perante uma organização que usa bem o seu dinheiro, gasta mais de 95% do dinheiro a fazer aquilo que é suposto, ajudar, em vez de gastar o dinheiro a angariar mais dinheiro ou com rendas da sede elevadas. Uma organização que se submete de livre vontade à avaliação externa, fornece todos os dados pedidos e é transparente sobre as decisões que toma e como as toma.

A classificação desta organização é tornada pública, assim como a classificação de outras organizações, e o dador pode escolher de forma informada a quem vai dar o seu dinheiro.

E que eu gostava era de conseguir que isto se passasse cá, para credibilizar as organizações filantrópicas em Portugal. Conheço várias que cumprem muitos destes critérios com distinção. Não deve por isso haver receio em se ser avaliado e permitir separar o trigo do joio. Porque há por aí também muito joio!

Exemplos lá de fora - Charity Navigator dos EUA


"Charity Navigator trabalha para guiar doações inteligentes. O nosso objectivo é ajudar as pessoas a doarem a organizações filantrópicas com confiança. Ao mesmo tempo, ambicionamos ajudar as organizações filantrópicas ao fazer brilhar mais forte organizações verdadeiramente eficazes. Ao fazê-lo, acreditamos que podemos ajudar a assegurar que as doações para causas filantrópicas crescem ao mesmo ritmo que as necessidades para programas de ajuda filantrópica.

A nossa abordagem para classifica as organizações filantrópicas é guiada por dois objectivos: ajudar os dadores e celebrar o trabalho da organizações filantrópicas. (...)"